O acreano é, antes de tudo, um povo bom e hospitaleiro. Alegre, de alto astral, recebe o visitante com os braços abertos. Esta foi a impressão mais forte que tive da minha ida ao Acre. Mas não só: encontrei uma comunidade que investe em cultura e participa dos eventos que são promovidos. Rio Branco, cidade limpa, de avenidas planas e largas, com a presença marcante da natureza, é a capital que ainda não se deixou dominar pela invasão de redes norte-americanas dos tipos “delivery” e “fast-food”.
O movimento euclidiano do Acre possui, como seu principal baluarte, o desembargador Dr. Arquilau de Castro Melo, que organizou, em 2004, a I Semana Euclidiana, com a presença dos renomados professores universitários Regina Abreu e Alexei Bueno, e do cineasta Noílton Nunes. Em 2005 o evento não chegou a se concretizar, porém desta vez a presença de professores e alunos da Universidade Federal do Acre foi expressiva.
O ciclo de estudos foi realizado nessa universidade, tendo início no dia 19 de junho, no Anfiteatro Garibaldi Brasil, com o tema “A visão de Euclides na colonização do Acre”, que tive a honra de apresentar. Nos dias seguintes houve mini-cursos ministrados pelo professor-historiador Nicola Costa, de São Paulo (que será o conferencista oficial da próxima Semana Euclidiana de São José), e por mim. Os assuntos abordados foram: a biografia de Euclides, o “rito sacrificial” em Judas-Ahsverus, letras de músicas que se cruzam com os textos de Euclides na Amazônia, e estudos paralelos entre Euclides e Guimarães Rosa.
Na abertura, houve ainda apresentação de um monólogo euclidiano, com lindo texto adaptado para os dias de hoje e a exposição de painéis com fotos de Euclides que foram restauradas, com um trabalho de primeiríssima qualidade.
Nas outras noites, o lançamento da home-page www.euclidesnaamazonia.com e a apresentação em um telão, também no anfiteatro da UFAC, do documentário gravado pelo produtor Rodrigo Neves, vencedor do 1º lugar do DOCTV, promovido pela TV Cultura. Após essa apresentação, houve caloroso debate e os pronunciamentos do dr. Arquilau, dos professores-palestrantes e de outros euclidianos do local. O professor Nicola simplesmente deu um “show” à parte, dramatizando sozinho o enredo de uma peça de sua autoria, “O menino Brasil”, que emocionou a muitos participantes.
DETALHES
É preciso registrar a atuação brilhante da Alessandra, secretária do Desembargador, no comando de uma equipe harmônica e de competência. Graças a esse trabalho de uma equipe tão bem sintonizada, o evento foi um sucesso. Tudo estava programado minuciosamente e o grupo não cometeu nenhum deslize, ao menos foi a impressão que tivemos. Nossos sinceros agradecimentos a todos: ao dr. Arquilau, à Alessandra, à Iriá, que pacientemente me acompanhou aos arquivos para pesquisa, e ao nosso motorista, sempre de plantão, o Egnaldo Arruda!
Um Homem
de ação
Difícil tarefa é agradecer à altura a recepção calorosa e gentil que tivemos por parte do Dr. Arquilau, além de tantos presentes oferecidos por ele. Apesar do cargo que ocupa, é um homem simples, de muita cultura, preocupado com a preservação da história acreana e, principalmente, euclidiano de coração.
O desembargador é responsável por algumas transformações que vêm ocorrendo em Rio Branco, entre elas, a de restauração de um lindo prédio que brevemente funcionará como museu. Dele se ouvem várias histórias, até mesmo de haver salvo Rodrigo e outros que faziam um trajeto em dois barcos pelos rios da região, quando um deles ameaçou emborcar. Desenvolve no Acre, há 10 anos, em parceria com órgãos federais, o “Projeto cidadão”, levando aos habitantes da floresta e dos pontos mais distantes e de difícil acesso atendimentos de saúde, educação, meio ambiente, segurança, esporte, cultura e lazer.
O dr. Arquilau nos recebeu para um jantar e para uma festa de confraternização em sua casa, mostrando que os prazeres da mesa também fazem parte dessa hospitalidade acreana. Aliás, delicioso o pato ao tucupi, prato em que essa ave é cozida com jambu, uma folha que deixa a língua ligeiramente adormecida, permitindo sentir melhor o sabor da carne. Na confraternização, além de um delicioso e enorme peixe assado, um belíssimo arranjo da culinária japonesa, sob a responsabilidade de uma ex-paulistana que iria inaugurar, nestes dias, um novo restaurante em Rio Branco. Foi ele também o responsável pela publicação e pelo lançamento do “Diário de Marcha”, de Euclides, que é o excerto do “Diário de Marcha da Comissão Mista Brasileiro-Peruana de reconhecimento do Alto Purus”, organizado por Alessandra Araújo de Souza (a “super” Alessandra), com a colaboração de Maria Lenice da Silva Lima, Ludmilla Machado Marques, Florêncio Gomes, Ney Cordeiro Figueiredo e Maria do Socorro Moraes Figueiredo, capa de Tissiano da Silveira.
A esse verdadeiro euclidiano que é o dr. Arquilau, desejo que sua luta pelo Acre seja sempre bem sucedida e que o movimento euclidiano naquele estado possa concretizar a esperança que Euclides exprime em carta a Escobar, datada de 31/12/1906: “2000 = Posteridade; afinal o único prêmio certo e digno (embora não sentido) dos verdadeiros lutadores.”
É responsabilidade também dos euclidianos daqui garantir esse reconhecimento ao nobre escritor e construir essa “ponte” entre Rio Branco e Rio Pardo.
CONCLUSÃO
Não foi possível conhecer muitos lugares, pois minha opção foi pela pesquisa, portanto voltei com a máquina repleta de fotos de jornais antigos, mas com poucos registros de locais e paisagens.
Enfim, voltei do Acre com a impressão de que Euclides também acertou ao afirmar ser ali, em meio àquela densa floresta, lutando contra uma natureza ainda em formação, que encontraríamos, no futuro, um dos melhores exemplares da raça brasileira. A natureza exuberante ali se incumbiria de selecionar os mais ousados, os mais fortes e os mais íntegros para a construção de um novo Estado. Um povo de fibra, cuja capacidade de resistência é entoada apaixonadamente neste trecho de seu hino:
“Mas se audaz estrangeiro algum dia
Nossos brios de novo ofender
Lutaremos com a mesma energia
Sem recuar, sem cair, sem temer
E ergueremos, então, destas zonas
Um tal canto vibrante e viril
Que será como a voz do Amazonas
Ecoando por todo o Brasil!”