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Euclides e o berço de Os Sertões
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Evoluir é aprender com a História
2009-10-28 15:09:46

 

 
Evoluir é aprender com a História
21/10/2009 16:31:35

Penso na História como referência para se evitar a repetição de erros desastrosos que possam gerar, como no passado, miséria e sacrifício de vidas inocentes. Chego a esta conclusão após a leitura de um artigo de Bilac que revela muito bem a visão preconceituosa e errônea de uma elite carioca desejosa de afastar de sua proximidade qualquer problema social capaz de comprometer a imagem de progresso e de civilização às avessas, importada da Europa para uma realidade totalmente diferente, a brasileira.

 

Veja o que diz Bilac, no Diário do Rio 9 de outubro de 1897:

 

“Enfim, arrasada a cidadela maldita! Enfim, dominado o antro negro, cavado no centro do adusto sertão, onde o Profeta das longas barbas sujas concentrava a sua força diabólica, feita de fé e de patifaria, alimentada pela superstição e pela rapinagem! Cinco horas da madrugada, hoje. Num sobressalto, acordo, ouvindo um clamor de clarins e um rufo acelerado de caixas de guerra. Corro à janela, que defronta o palácio do governo.

Uma escura massa de gente, na escuridão da ante-manhã, está agrupada na rua. Calam-se os clarins e as caixas de guerra. Há um curto silêncio. E, logo, dos instrumentos de metal, estrompam, e dos tambores que se esfalfam rufando, como corações atacados de hipercinesia, rompe, alto e vibrante, o hino nacional. É uma banda militar, que toca à alvorada, em frente do palácio, para celebrar ainda uma vez a grande nova, transmitida ontem à nossa ansiedade pelo telégrafo.

Todos os galos da vizinhança acordam, juntando o estridor de seu canto ao estridor das trompas da banda. Longe, um pedaço de céu, tocado de rosa e pérola, anuncia o dia.

Como é bom despertar assim, em pleno júbilo, já com o coração livre daqueles sustos dos dias passados, quando a gente abrindo os jornais, sentia o coração pressago, cheio de medo, temendo o horror de novas catástrofes, de novos morticínios, de novas derrotas!

Enfim, assaltada e vencida a furna lôbrega, onde a ignorância, ao mando da ambição, se alapardava perversa! Enfim, desmantelada a cidadela-igreja, onde o Bom Jesus facínora, como um cura Santa Cruz de nova espécie, oficiava, tendo sobre o espesso burel a coronha da pistola assassina!”

 

Euclides provou que assassinos não eram os sertanejos, estes apenas se defendiam do ataque dos soldados. Desejavam somente viver em paz, com sua crença própria, sem pagar impostos ao Estado. “Os sertões”, obra que esse escritor deixou sobre Canudos, revelam que a barbárie era praticada muito mais pelo exército do que pelos pobres jagunços.

Não é, por acaso, o mesmo pensamento da classe média e da elite existentes no Brasil atualmente? A violência aumenta, não há mais lugar seguro para ninguém. Qual a solução apontada, então, pelas instituições sociais e com a qual a maioria concorda? Prisões de segurança máxima, repressão, construção de condomínios que se tornam verdadeiros feudos e pretendem, assim, resguardar as pessoas da barbárie... Mas será mesmo que essas medidas resolvem alguma coisa?

Daqui a pouco iremos, novamente, ao Rio de Janeiro, para mais um evento relacionado a Euclides da Cunha... Ao passar por lá, há algumas semanas, fiquei questionando meus companheiros de viagem – professores que sempre participam de eventos naquela cidade – onde estava a “Cidade Maravilhosa”, porque eu só conseguia ver um sem-fim de favelas, muita sujeira e pichação, muita gente desabrigada, nas ruas, e tudo isso sob um calor insuportável, além de um mau-cheiro terrível, provocado, conforme disseram, pela poluição no mangue.

“Mas você tem que ir a Ipanema! Lá é o Rio!” – foi o que me falaram. Como assim? E todas aquelas pessoas, ou seja, a maioria da população, não é considerada carioca? Então não há “cidade” maravilhosa, há uma “praia” maravilhosa, o que é muito diferente!

Essa negação do outro, essa cegueira consciente, esse desejo de afastamento só faz o mesmo que em Canudos: aumenta a necessidade da defesa da sobrevivência, daí mais separação, mais violência, mais atitudes de “barbárie”, única voz capaz de chegar aos mais privilegiados. Porém isso tudo forma um círculo vicioso, difícil de ser rompido.

Sem o perceber, a própria atitude de violência de quem reivindica é usada em favor dos que não querem ouvir as reivindicações... Estes se servem do argumento de que, para o controle da sociedade, é preciso mais repressão, conseguindo, com isso, o apoio de parte considerável da população para as ações arbitrárias das instituições. Contra os senhores da retórica a pior arma é a violência; a melhor, a inteligência. Perdedor e vítima sempre é o cidadão trabalhador e honesto, que não sabe nem tem poder para fazer o jogo dos dois lados opostos que se aproveitam da ingenuidade dele!

A única saída é derrubar as barreiras criadas pela mente humana delirante e preconceituosa, egoísta e exclusivista, segura de que é a dona da verdade. Urge a abertura para um diálogo não de cima para baixo, porque isso seria imposição, mas todos em pé de igualdade, como se estivessem nos últimos momentos da vida e tivessem a consciência de que nada levarão deste mundo e de que o corpo que ora vestem os transformará na mesma terra de que vieram!

É preciso pensar que a melhor herança a deixar para nossos filhos e netos é a luta por um mundo mais justo e mais equilibrado. É preciso unir a cidade à periferia, respeitando as particularidades de cada uma, mas nem por isso investindo em obras de menor qualidade para os que já estão injustamente marginalizados.

O Estado negligenciou ou subestimou por muito tempo o ensino na zona rural, que sobreviveu apenas pelo idealismo e heroísmo de antigas professoras que não mediam esforços para ensinar a três ou quatro séries diferentes reunidas em uma única sala. Da mesma forma é preciso evitar que o mesmo ocorra na periferia das cidades. É necessário considerar que nas favelas há crianças que, como as nossas, também têm o direito de aprender em uma escola localizada na comunidade em que habitam.

Euclides afirmou que em Canudos bastaria um mestre-escola, não a brutalidade dos soldados armados que para lá enviaram. Que este fato nos sirva de exemplo.

 

Maria O. G. R. Arruda

 
Maria Olivia Garcia
 
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