Os Sertões não são e nunca foram
modelo imitável de linguagem acessível ao grande público.Ao
contrário, sua sintaxe arcaizante, sua retórica com base nas hipérboles
e nas antíteses, seu vocabulário de cunho científico não
suscitam imitadores. No entanto, a posição de realce deste livro
na literatura brasileira é evidente, porque algo de seu valor intrínseco
o faz superar imperfeições que em outras obras teriam sido mortais.
Os Sertões são uma grande obra literária, mas não
só isso.
Se não fosse a qualidade artística de seu
texto, o livro já teria caído no esquecimento. Ora, não
sendo ficcional, a causa da sua marcante presença na cultura nacional
está no senso inato do épico, que prevalece em todas as suas páginas.
Este sopro épico deu a Euclides o formato adequado para transmitir com
sinceridade a sua mensagem, que se resume na denúncia de um crime. Se
já estivesse em voga o termo genocídio, Euclides o teria empregado
para resumir o que ocorrera em Canudos.Sua convicção pessoal a
respeito de situações, conceitos e personagens históricas
é de tal modo persuasiva que, mesmo frente à mais fidedigna documentação
conflitante com aquela convicção, o leitor é sempre tentado
a rejeitar essa realidade e a aceitar a óptica euclidiana.
Com isso, Euclides em Os Sertões consegue atingir
os homens de todas as épocas, através da utilização
de elementos vitais como a miséria, a injustiça, o egoísmo,
a abnegação, a própria morte, que, por serem comuns à
condição humana, ultrapassam as barreiras geográficas e
linguísticas para criar entre o leitor e a obra uma verdadeira simpatia.
É o que se chama função sintonizadora da linguagem, presente
em toda obra de valor universal.
Daí a certeza da sobrevivência deste grande
livro como documento literário e como bem cultural.
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