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DR. GALOTTI E A SEMANA EUCLIDIANA
Odília Lopes Fernandes
Fim de festa. Termina mais uma Semana Euclidiana, com a participação
e o esplendor da estudantada juvenil.
Durante esse período o coração rio-pardense bate forte
e orgulhoso por esse evento tradicional percutindo os tambores nas ruas e praças
repletas de gente, para somar toda a vibração de resgate da memória
de um povo.
São centenas de estudantes vindos das mais distantes regiões do
Brasil, empunhando bandeiras, estandartes, e enchendo de calor e alegria a nossa
amada São José.
A comemoração, entre tantas novidades e variedades, sempre têm
mesmo objetivo: consagrar a memória do gênio da literatura Euclides
da Cunha.
Aqueles que acompanham todos os anos esse desfilar de gente entusiasta e bonita,
percebem que a cada ano os estudantes se alternam, ou seja, enquanto uns alcançam
patamares maiores de nível escolar e seguem para outras cidades em busca
de novas oportunidades, outros chegam para fazer parte e viver esse grande movimento
cívico.
A cada Semana Euclidiana, lembro-me com saudade de uma figura alta, imponente,
dentro do seu terno branco - destacava-se entre as autoridades reunidas em cima
do palanque no decorrer do desfile. Me refiro ao saudoso dr. Galotti, pessoa
que dedicou grande parte de sua vida aos estudos euclidianos.
Recordo-me que nas vésperas do lançamento de meu livro "No
Alvorecer dos Caminhos", estávamos em plena "Semana Euclidiana",
nos anos 90. Fui assistir a uma palestra na faculdade e qual não foi
a minha surpresa, ao constatar entre as autoridades presentes o dr. Galotti.
Esperei o orador terminar e, o final, fui diretamente falar com o médico,
que me recebeu gentilmente. Aproveitei a chance, para convidá-lo para
o lançamento do livro e também para comentar que ele "estava
dentro" daquela obra. (Referia-me a uma passagem do livro que narra a história
da velhinha Cecília que não regulava bem da cabeça e perambulava
pelas ruas da cidade na década de 30. Ela sonhava se casar com o moço
mais bonito da cidade, que era justamente o dr. Galotti!). Ele sorriu e disse:
"Pode contar comigo".
Foi gratificante para mim, com todo o meu nervosismo emocional, distinguir entre
tantos rostos amados a presença e a figura altiva do Dr. Galotti.
E assim começou uma amizade, da qual muito me orgulhava. Ele, como eu,
também residia em São Paulo. A partir daí, sempre que eu
estava para vir para São José, lhe telefonava para ver se tinha
algum recado.
Nma ocasião dessas, pelo tom de sua voz no telefone, senti uma certa
preocupação no ar. Estávamos muito próximos das
festividades euclidianas e, ainda mais, seria a comemoração dos
90 anos de "Os Sertões"). Quando ele começou a falar
sobre os fatos e relatos, ouvi tantas recomendações que achei
melhor anotar tudo para não esquecer nenhum precioso detalhe de seus
apontamentos.
Ele sugeria aos programadores das comemorações (detalhe muito
importante em suas recomendações, nunca pedir ou exigir e sim
"sugerir") que todas as edições de "Os Sertões",
da 1ª a 31ª, fossem expostas ao público inclusive as edições
estrangeiras. Lembrava também aos estudantes para a realização
de um rápido trabalho sobre as edições expostas. Apontava
a importância das vitrines do comércio na exposição
de trabalhos sobre o conteúdo das edições. Pediu para não
esquecer de colocar legendas em baixo de cada livro que, exposto, poderia ser
manuseado pelos estudantes, seriam mais ou menos 5 edições.
Entre outras coisas falava sobre os prêmios por classificação
e seleção dos trabalhos. Ainda conservo um velho caderno onde
ainda existem as marcas de sua extrema dedicação ao euclidianismo.
Minhas letras meio rabiscadas pela pressa de escrever ficaram quase indecifráveis,
na ânsia de acompanhar seu rápido raciocínio. Vejo agora
um detalhe importante que não percebi antes: ficaram expressas naquelas
páginas do meu caderno um momento dos seus muitos pensamentos euclidianos.
Dr. Osvaldo Galotti, sem dúvida, foi uma personalidade marcante e inesquecível
para todos nós. Nos tempos em que exercia a profissão de excelente
oftalmologista, sempre que podia, auxiliava aos necessitados levando seus conhecimentos
médicos da forma mais simples e acessível para os bolsos menos
favorecidos. Por exemplo, tinha uma fórmula fácil para aliviar
olhos turvos de poluição: água pura misturada com uma pitada
de sal. Dizia para tomar muito cuidado com os colírios. Mas eu acho,
ou melhor tenho a certeza, que ele utilizava dois ingredientes muito especiais
para ajudar os amigos e clientes: atenção e dedicação
a cada pessoa que o procurava.
Recordei agora de uma frase: "O único cheque que levarás
desse mundo está escrito: caridade e amor."
Muita paz.
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