publicado noDP de 30/08/03. http://www.pernambuco.com
CANUDOS
CylGallindo
JORNALISTA E ESCRITOR.
A Literatura Brasileira contém milhares de registros da violência queacompanha a vida social do País, desde o seu descobrimento. As crônicas de época,fragmentadas em diversos livros, dariam compêndios. O que se praticou contra osíndios, os negros, a mulher, a criança é estarrecedor.
No entanto, seria imperdoável não mencionar as obras poéticas de GonçalvesDias, enfocando o índio, e de Castro Alves, sobre o negro. Dos tempos atuais,temos a coletânea História das Crianças no Brasil, de Mary Del Priori, areunir trabalhos desde o tráfico-marítimo, quando muitas crianças eram seqüestradasnas cidades européias e trazidas para executarem tarefas nos navios e serviremaos instintos bestiais da tribulação, até os dias de hoje revelando a vida deadolescentes nos canaviais de Pernambuco. O povo judeu foi aquinhoado com aobra: Imigrantes Judeus - Escritores Brasileiros, de Regina Igel, paulistana,catedrática da Universidade de Maryland / USA. Trata-se de substanciosotrabalho, no qual a autora com refinado talento e elegância estilísticalevanta o componente judaico na Literatura Brasileira, do Século XVI ao SéculoXXI. Está implícito o sofrimento desse povo, desde a perda forçada daidentidade, aos processos do Santo Ofício. Tudo isso, porém, representa um grãode areia nas dunas destes 500 anos de Brasil. Seriam necessárias minuciosasescavações, na busca da verdade sofrida pelos já mencionados povos e mais ossem-terra, os sem-teto e por todas as minorias desvalidas da sorte.
Dada a impossibilidade de abarcar o leque da violência fragmentada emcentenas de obras, volto-me para a Guerra de Canudos, motivadora de um dosimportantes livros da Literatura Brasileira: Os Sertões, de Euclides da Cunha,onde morreram 25 mil pessoas.
Ao apresentar o livro Canudos e Outros Temas, de Euclides da Cunha,publicado pelo Senado Federal, já em 4ª. edição, adverti: Canudos não émais um arraial fincado no Sertão, agora há ramificações por todo o País.Os morros do Rio de Janeiro e as favelas das grandes cidades, talvez sejam maisCanudos do que a própria Canudos, no interior baiano, cuja tragédia Euclidesclassificou de "um crime!".
..............Há92 anos, a cidade de São José do Rio Pardo/SP, onde estou em companhia daprofessora Milza Barreto e encontrei o eminente pernambucano João AlexandreBarbosa, reúne estudiosos de várias partes do mundo na Semana Euclidiana, paraestudar, analisar e debater Os Sertões e a violência sofrida por Canudos. Fazdez anos que aqui grito: Canudos está na porta da nossa casa. O que aconteceuem Carajás, em Carandiru, o que tem acontecido nas cidades brasileiras são réplicasde Canudos. O crime está banalizado. Não podemos tapar o sol com uma peneira.Os governos vêm prometendo realizar a reforma agrária dentro da lei, a reformaurbana dentro da lei, o desemprego dentro da lei, eliminar a fome dentro da lei,mas onde está essa lei? Canudos volta a 100 anos como exemplo da injustiçasocial.
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