-É preceito assentado que um livro é considerado clássico
quando ele admite, com o passar dos anos, interpretação atualizada de sua mensagem.
Ou seja, o seu conteúdo é rejuvenescido com as releituras, que descobrem nele
uma verdade permanente ou um fonte de sabedoria ou beleza. Com certeza, o caso
de "OS SERTÕES" é um paradigma desse preceito. Ao ser publicado, no começo do
Século XX, ele provocou impacto no meio intelectual da época, quer pela coragem
do Autor ao denunciar um massacre humano histórico, quer pela profundidade dos
estudos sociais e científicos realizados, quer pela erudição do conhecimento filosófico,
quer pela maestria no domínio da língua e da dicção literária.
Passado um século, as únicas partes que podem ser tidas
como superadas na obra são as que não dependiam ao Autor: a científica e a filosofia
positivista, ambas atropeladas pela revolução tecnológica. Mas essas partes
eram exatamente as matérias secundárias do livro. Os assuntos principais mostram
impressionante atualidade: o erro político da nascente República brasileira;
o conflito entre a civilização do litoral e a civilização dos sertões. E, sobretudo,
é realçado com o tempo a excepcional arte de escrever do Autor, que permite
catalogar sua obra nas estantes de "Literatura" em vez de figurar ao lado dos
"ensaios" ou livros técnicos.
Por outro lado, a obra de Euclides da Cunha continua
a ser procurada nas livrarias e as editoras, nacionais e estrangeiras, continuam
a editá-la todos os anos. A maior prova de permanência de um livro, o de se
ter tornado clássico, é provocar o interesse do público leitor. Assim, comemorar
os 100 anos de "OS SERTÕES" será enriquecer a cultura brasileira com o debate
sobre uma de suas mais expressivas produções intelectuais.
PÁDUA LOPES - Jornalista
Fortaleza - CE
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